domingo, 23 de março de 2014

Uma análise que também já fiz... Abre-se mão muito fácil daquilo que, outrora, chamaram de amor.. Ótimo texto...

"Amor Líquido"

A tese de Bauman em seu livro "Amor Líquido" é que vivemos em um mundo onde as relações escorrem, elas não são solidas, duráveis. O amor, nesse mundo por ele retratado é, portanto, amor líquido. Para ele estamos na era do Homo consumens em que os bens e as relações são usáveis e descartáveis a fim de abrir espaço para outros bens e usos.

O homem moderno busca o outro pelo horror à solidão, mas a fragilidade das relações humanas é tanta que escorrem como água e procura-se manter este outro a uma distância que permita o exercício da liberdade e do descarte quando for conveniente.

Afirma Bauman: a mesma pessoa que no dia anterior disse “eu te amo – levanta-se da cama e exclama: acabou!

Como entender tal mistério? Como sobreviver depois deste salto? Ou seja a pessoa foi transportada do céu ao inferno em uma noite. O amor, dirá Bauman, “pode ser, e frequentemente é, tão atemorizante quanto a morte. [...] Assim, a tentação de apaixonar-se é grande e poderosa, mas também o é a atração de escapar.”

Nunca houve tanta liberdade na escolha de parceiros, nem tanta variedade de modelos de relacionamentos, e, no entanto, o medo de amar e a solidão é o grito da hora. Será que o amor virou terror?

Vive-se no desejo de se ligar, mas paradoxalmente é imprescindível cortar a dependência, deve-se amar, porém sem muitas expectativas, pois elas podem rapidamente transformar um bom namoro num sufoco, numa prisão. Vive-se acreditando que o próximo parceiro(a) será melhor. Com isto, se entra e sai de casos amorosos com a mesma naturalidade em que se troca de roupa no fim do dia.

A conclusão não pode ser outra: a solidão.

Para amenizá-la se apega a contatos virtuais que possibilita com maior facilidade o descarte e a falta de vínculos “a solidão por trás da porta fechada de um quarto com um telefone celular à mão pode parecer uma condição menos arriscada e mais segura do que compartilhar um terreno doméstico comum”, diz Bauman.

Crescem as redes de interatividade mundiais onde a intimidade pode sempre escapar do risco de um comprometimento, porque nada impede o desligar-se é onde se pode conectar e desconectar sem qualquer compromisso, promovendo relações fantasiosas superficiais protegidas pelo anonimato.

Para desconectar-se basta pressionar uma tecla; sem constrangimentos, pois não há o testemunho de lágrimas de lamúrias, nem se compartilha de prejuízos psíquicos.

Nas relações líquidas com seu formato relâmpago, não há tempo para o adiamento, para postergar a satisfação do desejo, nem para o seu amadurecimento. Desta forma é mais viável uma sucessão de encontros excitantes com momentos doces e leves que não sejam contaminados pelo ardor da paixão, do vinculo duradouro.

Os compromissos intensos e de longo prazo são uma armadilha a ser evitada. O compromisso fecha a porta para novas possibilidades (quem sabe, até melhores). Mantém-se então sempre a porta aberta.

Vive-se constantemente em expectativa de que o melhor está por vir e que há sempre algo melhor pelo que esperar desta forma as pessoas acabam desaprendendo o amor; tornam-se incapazes de amar.

A sensação de que se pode ser abandonado, substituído a qualquer momento, impede a entrega total – e, porque não se entrega totalmente, o amante parcial ou virtual vive na a constante sensação de que está vivendo um equívoco, ou que está esquecendo algo, deixando de experimentar alguma coisa. Isso faz com que o outro viva carregado de ansiedade.

Consideremos que o amor encontra seu significado não na posse das coisas prontas, completas e concluídas, mas no estímulo a participar da gênese dessas coisas. No amor cria-se o que vale a pena ser amado. Não existem pessoas prontas; mas se pode caminhar com elas rumo à maturidade sendo que neste caminhar as duas partes devem depositar suas pérolas.

O amor não é um caminho de pura satisfação, mas de transformação e realização. O amor não acontece na relação superficial, esporádica, virtual, meramente física, mas num relacionamento de proximidade que conduz à intimidade, em direção à profundidade do ser que ama.

É certo que nunca houve nem haverá receita universal para desfrutar dessa dádiva que é o AMOR, mas pode ser assertivo conviver com quem é prazeroso conversar!

Lourdes Andreto

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