sábado, 27 de julho de 2024

Hoje esse texto me define...

 

 
Metade

Oswaldo Montenegro


Que a força do medo que tenho

Não me impeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo em que acredito

Não me tape os ouvidos e a boca

Porque metade de mim é o que eu grito

Mas a outra metade é silêncio


Que a música que ouço ao longe

Seja linda ainda que tristeza

Que a mulher que amo seja pra sempre amada

Mesmo que distante

Porque metade de mim é partida

Mas a outra metade é saudade


Que as palavras que eu falo

Não sejam ouvidas como prece, nem repetidas com fervor

Apenas respeitadas como a única coisa

Que resta a um homem inundado de sentimentos

Porque metade de mim é o que ouço

Mas a outra metade é o que calo


Que essa minha vontade de ir embora

Se transforme na calma e na paz que mereço

Que essa tensão que me corrói por dentro

Seja um dia recompensada

Porque metade de mim é o que eu penso

E a outra metade é um vulcão 


Que o medo da solidão se afaste

E que o convívio comigo mesmo

Se torne ao menos suportável

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso

Que eu me lembro ter dado na infância

Porque metade de mim é a lembrança do que fui

Mas a outra metade, não sei


Que não seja preciso mais do que uma simples alegria

Pra me fazer aquietar o espírito

E que o teu silêncio me fale cada vez mais

Porque metade de mim é abrigo

Mas a outra metade é cansaço


Que a arte nos aponte uma resposta

Mesmo que ela não saiba

E que ninguém a tente complicar

Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer

Porque metade de mim é plateia

A outra metade é canção

E que a minha loucura seja perdoada

Porque metade de mim é amor

E a outra metade também



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